Para quem chegou até este blog por acaso ou engano:
Aqui se escreve sobre a política e o modo de viver de uma cidade chamada Bagé, localizada no Sul do Rio Grande do Sul, um Estado da República do Brasil, no continente Americano do Sul. Aqui também se ironiza e se cultiva o bom humor, mas principalmente, lembra-se às autoridades que não se legisla ou governa de qualquer jeito, sem responsabilidade ou sem o olhar envolvente de quem está atento às coisas do mundo.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

O afeto de Bagé
Morreu Paulo Figueredo, o Paulinho Vesgo. 
Aquele que Bagé elegeu  vereador em 2000, pelo Partido Socialista Brasileiro, com 980 votos. 
Foi o décimo mais votado numa Câmara de 21 eleitos. 
O PSB elegeu dois vereadores. O outro era Ubaldo Saraçol, que morreu em 2007. 
Paulinho não entendia de política, não gostava de política  e não se importava com essa história de ideologias partidárias. Bobagem! Pura bobagem! Assim como também nunca disse que seu negócio era o pragmatismo, que fazia as coisas sem ver cor partidária. Embora fosse possível. Mas isso não era discurso pra ele.
Paulinho... era o Paulinho Vesgo, que um dia tentou mudar seus olhos para deixar de ser vesgo e “trocar de sobrenome”. Sim. O codinome virou outro nome. Aí, não deu, porque algum médico disse que era melhor ficar com os olhos como estavam por não haver garantia na cirurgia.
Quando foi eleito vereador, em outubro de quase onze anos atrás, Paulinho não ouviu de seus eleitores, pelo menos boa parte deles, “quero ver o que tu vais fazer agora”. Não. 
Paulinho nunca ouviu de seus eleitores essa cobrança, porque eles sabiam - e só eles sabiam , mais ninguém, que votaram em Paulinho para colocá-lo no serviço público municipal. 
O povo de Bagé, como um ato de afeto, ofereceu ao seu filho vesgo uma segurança financeira por quatro anos. Era um pedido de desculpas, era uma indenização pelo bullying, pela ofensa sofrida. 
Mas, Paulinho não sabia disso. Ou sabia e se fazia de desentendido. Ele gostava de se fazer de desentendido. 
Um dia num bar na rua Monsenhor Costábile, quando era o Bar da Iza, alguém disse que se tratava de uma “brincadeira”, sua eleição era uma “gozação” das pessoas . Ele riu. Não se importou. Não comentou. Não era com ele. 
Na verdade, aquele alguém que disse o que disse para ofender Paulo Figueredo, não sabia nada de nada da alma das pessoas, da dívida imensa que brotava no coração dos bageenses. Não sabia ele que Paulinho Vesgo era filho desta terra, um filho que todos conheceram, homossexual escancarado, com mil trejeitos, alegrias e tristezas, carnaval, futebol e companheiros de trago. 
Aquele homem que tentou ofender Paulinho, revelando que tudo não passava de um trote, não sabia do abraço dos bageenses ao seu filho semianalfabeto, pobre, deficiente visual e homossexual - numa terra de machistas preconceituosos. Não sabia ele que o povo de Bagé pedia perdão oferecendo uma cadeira na mais alta casta social de sua terra, um lugar de autoridade no Poder Legislativo.
Foi feliz o Paulinho Vesgo, feliz nos lugares em que frequentava. 
Feliz com o carnaval da Aliança ou com um gol do Guarany. Feliz nos cabarés e bares de Bagé. Feliz de poder dar opinião em assuntos que não era chamado. Feliz, dentro dessas limitações que a felicidade nos impõe.