Para quem chegou até este blog por acaso ou engano:
Aqui se escreve sobre a política e o modo de viver de uma cidade chamada Bagé, localizada no Sul do Rio Grande do Sul, um Estado da República do Brasil, no continente Americano do Sul. Aqui também se ironiza e se cultiva o bom humor, mas principalmente, lembra-se às autoridades que não se legisla ou governa de qualquer jeito, sem responsabilidade ou sem o olhar envolvente de quem está atento às coisas do mundo.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Luciano Pinto detona Secretaria da Fazenda em depoimento à CPI da Câmara de Vereadores

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga possíveis irregularidades na Secretaria Municipal da Fazenda ouviu no dia 3 de junho, o advogado e servidor municipal, contratado como Cargo de Confiança do Executivo para ser procurador Fazendário de Bagé, Luciano Porto Pinto.
Exerceu suas atividades  da metade de 2007 até outubro de 2010.
Quais as atividades que exercia, especificamente?
Luciano - Execuções fiscais que tramitam já em maio de 2007 existiam no Forum 20 mil processos de execução fiscal ajuizados. Tomamos a frente das execuções. Ao chegar na Procuradoria só havia dois advogado trabalhando nos 20 mil processos. Execuções que montava mais de 20 milhões de reais, o que pedia um investimento maior do quadro. Não havia controle, levantamento de quantos processos, não se tinha isso com precisão, não se sabia quantos processos tramitam na 1a., na 2a ou na 3a vara cíveis, não se sabia quanto arrecadavam com esses processo, não se sabia quantos processos passavam mais de cinco anos dentro do Poder Judiciário sem nenhuma movimentação por ausência de controle...
Pensei que minha atividade seria essa, exclusivamente, mas não, elas se alastraram bem mais do que as circunstâncias da Secretaria da Fazenda. Até o último momento em que estive lá, surgiam os mais diversos problemas de cadastro de ISS, e que eram encaminhados para aquele setor. A maior parte do tempo, atendiamos essas pessoas ao invés dos processos. Fazíamos diversos trabalhos, também, além da Fazenda, por falta de advogados no quadro.
GUSTAVO - Quando o senhor entrou em 2007 tinha 20 mil processos, com dois advogados, vocês conseguiram dar conta ou teve muitos arquivados?
L.P. - O número de processos arquivados era muito significativos. Não tinha mais solução, a prescrição já tinha tomado conta. 
Adriana Lara - Quantos processos prescreveram?
L.P. - Nunca fizemos a quantificação, não havia como trabalhar com o que estava perdido. A decisão interna era trabalhar em cima do que era possível ter resultados. Perto de 2009, fomos chamados numa vara cível e lá foi nos mostrado a quantidade de processos arquivados, sem solução de continuidade. (...)
Adriana - O senhor sabe o valor que a Prefeitura deixou de arrecadar?
L.P. - Não. Mas, se tinha 20 mil processos, na época a dívida ativa ajuizada era de 20 e poucos milhões, o secretário da Fazenda disse aqui que (...) a dívida ativa ajuizada passava de R$ 60 milhões.(...) Portanto, é possível fazer um cálculo por aproximação (Ele quis dizer que o cálculo pode ser feito por 1/3 do total devido).
Adriana - Se tivesse mais advogado não teria tanta perda?
L.P. - Tenho convicção disso. Não é um problema exclusivo de Bagé, mas o problema de Bagé é grave. 
Parece que a intenção do município nunca foi cobrar do contribuinte. Se não teria investido na procuradoria fazendária, em equipamentos novos, não é possível que estivesse lá um estagiário trabalhando se não tinha computador. O que ele fazia, então?  (...) Estou à vontade para dizer isso agora, porque estou foram, mas todos os meus colegas que aqui estiveram disseram a mesma coisa, o secretário da Fazenda, o membro do Controle Interno, de forma indireta. (...) Todos qdisseram “nós sabíamos que a Procuradoria Fazendária tem deficiências”. Ora, se todos sabiam que tem deficiência porque deixaram? Eu não sou ordenador de despesas, eu não contrato pessoal... (...) Se todos sabiam, na verdade, todos eram coniventes com a situação de “deixa assim”. Parece que é isso, mas é um juízo pessoal. Opinião minha de que não houve interesse de realmente cobrar.
Gustavo - Se a Procuradoria da Fazenda trabalha só com as execuções ou outra coisa?
L.P. - Não há exclusividade. Prestávamos assessoria para outras secretarias. Planejamento e Desenvolvimento Econômico, são exemplos.
Gustavo Morais - Quantos processos existem tramitando?
L.P. - Ninguém sabe. Cada um diz um número. A presidente do inquérito administrativo também não sabe. (...) Isso demonstra que até 2011, a Secretaria da Fazenda não sabe.
Provavelmente em torno de 17 mil quando eu saí da Fazenda.
O valor dito pelo secretário é de mais de R$ 60 milhões. 
Quanto eu saí era em torno de 40 milhões.
Gustavo Morais - Como é feito o controle do ajuizamento dos processos judiciais?
L.P. - Da forma como é possível. As terças pegávamos os processos em cargas da vara cível. Ouvi o secretário dizer que havia um controle melhor dos maiores devedores do município. Penso que isso é impossível. Se não tem como controlar os processos, não tem como fazer determinadas estratégias para trabalhar com grandes devedores.  O que ele mesmo falou? Porque os grandes devedores tem como contratar bons escritórios de advocacia de Porto Alegre, tem grandes estruturas, muito superior a que existe na Secretaria da Fazenda, procrastinando os feitos, fazendo com que os processos sofram todo o tipo de recurso, e nós não temos tempo e nem pessoal adequado para fazer uma estratégia de igual para igual com esses grandes devedores. Então, na verdade, o grande devedor foi sempre um temor da Procuradoria Fazendária, porque ele exige muito tempo. Eu posso dizer que no tempo em que lá estive somente os CCs da Procuradoria é que trabalhavam com esses processos de maior complexidade, porque o concursado não quer trabalhar com processo de complexidade, o concursado quer trabalhar no processo que é simples. Ele faz o “manda suspender”, “manda fazer uma penhora”. Agora um processo que seja oriundo de título do Tribunal de Contas do Estado, esse vai pro CC, porque se o Cargo de Confiança errar é problema dele, cai fora. O concursado se detém, graças ao efetivo da Procuradoria, todos os funcionários são esforçados, tecnicamente com condições, mas sem estrutura e número adequado. Só tínhamos controle das audiências que fazíamos. 
Gustravo - O senhor sabe quantos devedores devem acima de um milhão de reais para a Prefeitura?
L.P. - Acima de um milhão não são muitos. Não vou saber precisar. O Juarez (Ramos) mencionou a Statdbus aqui, o secretário disse que teria uma questão de sigilo. Mas, como estou sendo interpelado pela CPI e a Casa Legislativa tem legitmidade para fiscalizar o que é público. (...) Eu lembro, por exemplo, que um grande devedor é a Unimed. Aliás, era uma grande dor de cabeça que nos dava em razão da sua dívida. A Unimed tinha dois processos. (...) É uma grande devedora de ISS. Somados os dois podem passar de R$ 2 milhões com o município. Quando cheguei lá era de conhecimento que a Unimed era chamada para negociar. .É uma prestadora de serviço, cooperativa, que possui um grande lobbty em todo o país e precisávamos contratar a quantidade de recursos e o não pagamento. Ela defendia que enquanto cooperativa não devia pagar Imposto Sobre Serviço. Nós entendíamos que o ISS incide sobre a venda do plano de saúde para o terceiro. Porque isso não é feito entre os médicos, entre os cooperados. É venda de plano para um terceiro. Dessa dívida nunca foi pago nada. Existem duas ações ajuizadas. Dessas ações não se fez nada. A Unimed tentou fazer algumas ofertas para o município. Eu disse que seria contra a lei nos submeter ao poder econômico, do tipo devo R$ 2 milhões, mas pago 600 mil. Eu disse ou se faz o acordo dentro da Lei, porque não se pode mexer na base de cálculo. 
Gustavo - Alguma empresa mais (A Unimed acabou sem pagar), o Juarez, do Controle Interno, citou que existia também ex-prefeito devedor, como estão esses processos? 
L.P. - Os ex-prefeitos sofrem uma fiscalização mais profunda do Tribunal de Contas e do Ministério Público. Os ex-prefeitos são apontamentos de suas administrações, apontadas pelo TC e que se transformaram em dívida ativa. (...) Esses processos existem, eles estão tramitando. Em andamento natural.
Gustavo Morais - Temos informações de bancos devedores...
L.P. - São inúmeros os processos. Os bancos são os grandes devedores. Pelas multas, por descumprimento das filas, portas giratórias... Alguns deles podem ter dívidas superiores a R$ 2 milhões de reais. Em razão de multas. Quando os valores são menores, geralmente, eles pagam.
Jussara - Quando o senhor aborda na sua fala a contratação de escritório. Como se dá isso.
L.P. - Eu falei das empresas devedoras, algumas contratam. Mas, no início do governo Mainardi houve a terceirização de escritórios de advocacia para dar agilidade aos processos. Mas, alguns acabaram desistimulados. (...) Existem ainda dois que perduram, Valter Pereira Filho e Clementino Pigatto. 
Jussara - O senhor coloca que em 2007 tinha acúmulo de trabalhos, mas não citou os escritórios, que tinham demanda.
L.P. - No máximo três mil processos e hoje não chegam a dois.Quando cheguei todos eles abandonaram, o contrato tinha tempo determinado. Na verdade, quando cheguei a grande maioria das terceirizadas estavam saindo. O problema se avolumou. 
Jussara - Qual os encaminhamentos em relação às terceirizadas? Quais foram as suas iniciativas para que pudesse dar conta da complexidade do fato ante os processos que se avolumavam? Em que período foi rompido o contrato?
L.P. - O volume já estava grande. Com a Lei de Responsabilidade isso foi acelerado, de 2000 para 2001 era preciso executar tudo o que fosse possível, e assim foi feito. No governo Azambuja foi feito o chamamento para advogados terceirizados e no governo Mainardi também.
Quando os advogados contratados começaram a entregar os processos, comunicamos ao prefeito Mainardi. (...) Não tendo muito sucesso com isso, mesmo tendo levado um puxão de orelha do Juarez e de Tirso (secretário), resolvi informar ao Tribunal de Contas a nossa situação, o número de pessoas. Depois, o Juarez acabou dizendo que recebeu um apontamento sobre a falta de pessoal. (...) O medo que eu tinha era responder pelas prescrições dos processos. Ainda bem que não foi isso que aconteceu. 
Adriana Lara - O senhor fez uma declaração muito importante quanto aos maiores devedores. O senhor disse que os funcionários do quadro efetivo acabam não querendo fazer essas execuções, que acabam ficando para os CCs. Quantos CCs são na Fazenda?
Luciano - Eu e o Adilberto. Hoje, eu não sei.
Adriana - Vocês conseguiam acompanhar esses processos?
Luciano - Eu levava para casa. Não havia como fazer tudo ali. Se estivesse terminando o prazo, pedíamos adiamento. Não tem como fazer. (...) A Justiça envia expediente à Procuradoria da Fazenda para que devolva documentos sobre pena de busca e apreensão. (Ele cita milhares). E quando isso acontece, pedimos o adiamento ou arquivamento para que não se perca o processo. 
Gustavo - Queria que nos informasse, 150 processos foram examinados pela Sindicância da Fazenda, nesses 150 foi encontrado um desvio de R$ 65 mil, que é atribuído ao senhor. Por que não apareceu na contabilidade da Prefeitura esses 65 mil reais? Qual foi o erro ou qual a conta que o senhor depositou da Prefeitura?
Luciano - Em determinado momento, a Procuradoria Fazendária, entendeu que existiam procedimentos atribuídos a minha pessoa, dentro dos processo que não correspondiam, procedimentos dentro do sistema informatizado DB Seller, que o município utiliza, que não correspondiam à realidade existentes nos processos. Baseia-se a acusação no princípio de que se o município não consegue encontrar determinado depósito, o Luciano é o culpado. Bom, eu não encontro um depósito e eu tenho que justificar o não encontrar esse depósito com o Luciano sendo culpado. Eu vou induzir todo um procedimento administativo para poder responder aquilo que eu quero encontrar, encontrar o Luciano como culpado. “Eu vou encontrar o Luciano como culpado, eu vou revestir o processo, vou juntar folhas, vou tirar copias, vou demonstrar que existem erros, que existem falhas, vou demonstrar o que eu quiser, mas vou chegar a esse resultado.” Só que é preciso que se respondam outras coisas. Por que não se questiona a capacidade que tem o município de saber aonde estão os seus créditos? O município tem a capacidade, realmente, de saber aonde estão  os seus créditos para poder acusar alguém, dizer que esse alguém desviou, se apropriou? 
Primeiro: Não faz parte da minha história, nem da minha família, qualquer atividade ilícita. Não faz parte da minha história fazer atestado de torpeza, de burrice, se todo o servidor da Secretaria da Fazenda possui uma senha, se todo o registro que permanece no sistema está registrado, feito pelo Luciano; se todo o alvará expedido pelo Forum para os advogados em execuções fiscais consta o meu nome; se tudo consta a minha assinatura; se tudo pode ser revisto a qualquer tempo, - e se eventualmente nós erramos, e erramos, todo o procedimento - isso foi dito aqui e erradamente - isso me surpreende - o procurador fazendário  não tem o poder de dar cancelamento de dívida, ele tem o poder de fazer registro. Só quem faz o cancelamento de dívida é o fiscal tributário porque é atribuição em lei. Ele não tem acesso a fazer o cancelamento de dívida, só de fazer o registro. “E se ele erra no registro?” Erra.  Basta que se abra o sistema DB Seller, aparece supostamente o cidadão fulano de tal devedor dos exercícios de 99, 2000, 2001, 2002, aparece os quadradinhos, eu estou atendendo determinada pessoa, eu ‘clico’ naqueles quadradinhos para excluir determinados exercícios que estão prescritos para registrá-los... e se eu erro marcam todos. Isso acontecia. As vezes erramos e excluíamos tudo, inclusive exercícios que não estavam prescritos. O que nós fazíamos? Dava um tempo, o fiscal tributário ligava e dizia: Luciano, tu fizesse alguma coisa errada. Ou, então, eu ligava para ele e pedia que cancelasse o registro de cancelamento, porque eu tinha errado.” Isso é possível, factível. Isso era rotina. 
Eu posso fazer o cancelamento de uma dívida? Posso. Preciso fazer uma referência sobre o que foi dito aqui (na CPI), porque me chama a atenção o tremendo desconhecimento de alguns que me antecederam. “É possível nós pedirmos a extensão de um processo em curso? Não. Não pode.” Mas, que absurdo. Pode. Como não pode? Não só pode como está amparado em lei municipal. (...) 
Gustavo - Há condições da Preeitura estar mantendo alguns privilégios?
Luciano - Eu não sei se eu disse isso. Meus antecessores aqui, todos envolvidos demais no trabalho, não tem tempo para avaliar se é esse ou aquele. Nós somos um quadro subordinados ao secretário da Fazenda, que por sua vez é subordinado ao prefeito. A responsabilidade, em razão de materia de Responsabilidade Fiscal, é do gestor. Se há privilégio, não sei. Provavelmente, como em todo o lugar, como se sabe, né...?
Gustavo Morais - O senhor pode nos esclarecer melhor a falta desses 65 mil reais? Onde acharam a falha desse dinheiro?
Luciano - Posso. Eu fui afastado da procuradoria da fazenda em outubro. Todos os documentos que existiam ao meu cargo foram arrecados pela Procuradoria Jurídica do Município, que penso tomou para si, inclusive, a responsabilidade de dar cumprimento aos prazos processuais que corriam, após a minha saída. Que assim não fez, perdeu prazos. Depois que eu saí continuam apontando, dizendo que eu sou respnsável por prazos. E eu não estava mais. Ainda me restou responder a um inquérito civil do Ministério Público. em razão do município ter perdido prazo. Injustifiado. Ambos vencidos em 16 de novembro, data em que eu não estava mais. Acho isso injusto. 
O município alega que tem contra mim é que não conseguiram encontrar determinados depósitos. Eu não estava no município antes de 2007 . (...) É possível, sim, receber depósito em sua conta e esses valores não serem encontrados. Isso não é caso isolado. Existem contribuintes que pagam e que o município não encontra. E se não encontra onde está essa verba arrecadada? Ora, eu posso fazer uma suposição. Fazem suposição ao meu respeito. Uma suposição daquilo que ouço internamente: Ora, na hora de mandar as contas para a Câmara de Vereadores para aprovação não pode aparecer receita que não tem origem. Se apareceu um valor e esse valor está depositado, mas não sei de onde é, bota como outra coisa, bota como honorários advocatícios. (...)
Um pouquinho antes de eu sair aconteceu um caso. Chegou um cidadão que fez um protocolo - ele e a filha - processo número 100460. “Meu nome é Afonso Celso Leal. Fiz um pagamento de cota único de IPTU, tenho o recibo, e o município me cobrou esse valor. E eu paguei de novo, não me dei conta que já tinha pago. (...) Procuramos localizar o depósito da “cobrança em duplicidade”. O técnico de informática Luis Cláudio de Lima procurou, não encontrou e me disse que “existe uma possibilidade muito grande de cidadão que pagam seus impostos e que o município não consegue encontrar o pagamento em seus depósitos”. Isso existe?, perguntei. Existe, respondeu. E eu não sabia. Mas, o que se faz num caso desses? Não se faz. Os casos vão acontecendo. 
O cidadão pagou. E onde foi parar esse dinheiro? Eu não estava na prefeitura. (...) 
Aconteceram outros casos. Pode ser que agora apareçam outros que pagaram em duplicidade. 
Na verdade o que o município atribui a mim é a sua incapacidade de poder gerenciar valores. É mais fácil culpar um e se exime do resto.  Fizeram um procedimento administrativo com uma pressa incessante. Logo depois, eu saio da Preeitura e aquilo que não sou culpado e não posso ser culpado, como a perda de prazos, é atribuída a mim. Depois que eu saí ainda abre uma sindicância para apurar fatos que  a mim não pode ser atribuída culpa. Isso me causa um grande dissabor, desde lá. 
Adriana Lara - A culpa dele. Sobre a baixa em 65 mil. 
Eu dei baixa não em 65 mil, muito mais. Por quê? Os processos que existiram em extinção foram cancelados. 
Depois de algumas respostas evasivas e voltar a afirmar sua inocência, o presidente da CPI, Gustavo Morais, sugeriu que Luciano Pinto voltasse para depor na próxima semana.